Com alegria, venho partilhar que nasceu o belo presente que a Providência Divina concedeu à nossa família: Maria Amélia. Ela é a quinta dos nossos filhos: Antônio José (que já está no céu), Paulo José (10 anos), Maria Guadalupe (8 anos), Maria Isabel (5 anos) e, agora, nossa pequena Maria Amélia (hoje, com 1 mês de vida).
Essa história começou no dia 1º de outubro de 2024. Sob o olhar amoroso de nossa amiga Teresinha, fomos agraciados com a notícia de sua chegada. Eu, Joaz, e minha esposa, Luiza, somos casados há 11 anos, consagrados na Comunidade Católica Shalom como Comunidade de Aliança, e recebemos essa notícia num grande dia. Foi uma imensa alegria, mas confesso que meu coração não foi tão dócil como o da minha esposa. Relutei por dias, semanas, até compreender o que estava acontecendo.
Exponho aqui minha limitação: foi difícil acolher essa graça. Naquele momento, eu só enxergava o trabalho, as despesas, a perda de um certo conforto — já que nossa filha mais nova estava prestes a completar 5 anos e já demonstrava certa independência. O coração foi amolecendo aos poucos, e isso me doía profundamente, pois eu tinha consciência de que havia sido feito justamente para essa hora. Precisava assumir minha missão e renunciar a tudo o que fosse contrário a ela. Maria Amélia, como os demais filhos, era minha missão. E ponto final.
Mas o Senhor, que nos atrai com a ternura de Seu Coração comivo, me esperou. Assim como esperou Tomé por sete dias até aparecer novamente.
Já era dezembro, e viajamos para Aracaju, minha terra natal. Ao voltarmos, seguimos com os exames de rotina do pré-natal. Era o final de janeiro, Luiza estava com 20 semanas de gestação, e estávamos tranquilos, pois a última ultrassonografia morfológica estava normal. Porém, essa nova imagem revelou um quadro diferente: a médica identificou má-formações em várias partes do corpo da bebê — mãos, braços, pernas, e, principalmente, na cabeça. Havia um quadro crítico de hidrocefalia, provocado por uma má formação do corpo caloso, uma estrutura essencial no cérebro, que, no caso de Amélia, não estava totalmente formado, o que causava acúmulo de líquido e o consequente crescimento desproporcional da cabeça.
Foi tudo muito rápido, muito impactante. Não soube o que dizer a Luiza. Apenas a abracei. Naquele dia, sentia que não estava sendo o pai que Deus queria que eu fosse. Fiquei dilacerado. Alguns médicos chegaram a cogitar a possibilidade de uma síndrome, talvez Edwards. Até hoje não temos confirmação. A síndrome de Edwards é considerada, segundo a literatura médica, incompatível com a vida, embora existam raros casos de pessoas que sobrevivem, geralmente com muitas limitações.
Daquele momento em diante, acolhemos com dor. O diagnóstico era que dificilmente a gestação chegaria até o fim — talvez nem asse da 24ª semana. Foram dias extremamente difíceis, especialmente para Luiza. Recebemos conselhos para interromper a gestação. Alguns diziam que não fazia sentido continuar, que havia riscos para a mãe. Mas desde o dia daquele exame, tínhamos uma certeza: nada nos faria desistir desse presente do Céu. Mesmo com os riscos, mesmo com a dor, com a possibilidade de uma cirurgia e um parto complicado, nada nos faria abandonar esse barco. Porque sabíamos: o Senhor estava conosco. Ele e a Virgem Maria estavam conosco. Contávamos com a intercessão dos santos, especialmente Santa Teresinha, e dos Anjos.
A cada nova ultrassonografia, os médicos diziam: “Está tudo ok… mas dificilmente sobreviverá.” Até que, ao chegar nas 32 semanas, o médico, desconcertado, disse: “É… pelo jeito, vai nascer mesmo.”
E Maria Amélia nasceu!
Dia 09 de maio, às 00h14. Linda e bela. Assim que nasceu, ainda no centro de parto, após ser reanimada, foi batizada. Estavam presentes apenas eu, o padre, a médica pediatra, uma enfermeira e uma técnica. Naquela pequena sala, unidos ao Céu, aquela criança se tornava filha de Deus. Cristã. Católica. Um milagre dentro de outro milagre. Todos ali testemunhavam o nascimento não apenas para este mundo, mas para a eternidade. Meu coração exultava de alegria, como o de Nossa Senhora ao entoar o Magnificat. Uma alegria indescritível.
Após o batismo, Amélia foi levada à UTI Neonatal, onde permanece. Precisa atingir um peso mínimo para se submeter a uma cirurgia de colocação de uma válvula para drenar o líquido do cérebro. Ela enfrenta intercorrências causadas pela pressão intracraniana.
Visitamo-la diariamente. E, embora o desgaste físico e emocional seja imenso, a dor maior é deixá-la lá. Quando me despeço, por vezes, ela me olha nos olhos, como se enxergasse minha alma. E eu digo: “Filha, papai precisa ir, certo? Mas papai deixa o coração aqui e leva o seu, tudo bem?” É doloroso demais. É como estar no Calvário e ter que dizer a Jesus que volto depois.
Nesses momentos, olho para Aquela que é a única capaz de permanecer de pé no Calvário. Sem Ela, ninguém a a dor. Ela, que foi o consolo de Jesus, é também o nosso. Podemos ouvi-La dizer: “Não se aflijam, estou aqui. Aqui permanecerei, contemplando-a como contemplei meu Filho. Afinal, como Ele, ela também é minha filha.”
Todos os dias, ao chegar, rezamos o Ofício com ela. Estamos ali não apenas por Amélia, mas por todas as crianças e pais que ali sofrem. A dor é imensa. Presenciamos óbitos, procedimentos assustadores, crianças em condições delicadíssimas. E eu digo a ela:
“Filha, sua dor não é só sua. É deles também. Como cristã, você precisa se ofertar por eles.”
Confesso: não é fácil entrar naquela UTI todos os dias. Mas, no meio da dor, há paz. A fragilidade daquelas crianças reflete a do Crucificado. Vejo a pureza de Deus naqueles rostos. O Calvário dói, desgasta, humilha, dilacera. Mas é nele que a graça acontece. Como no Tabor, ali me sinto transfigurado. Jesus se desfigura para me transfigurar. É assim que tenho vivido esses dias: na oferta, na conversão. Sei que Luiza também.
O mundo diria que tudo isso não vale a pena. Mas vale. Cada minuto. Cada lágrima. Cada sorriso.
Durante a gestação, rezando sobre tudo isso, o Senhor nos recordou Isaías 42: “Não quebrará o caniço rachado, nem apagará o pavio que ainda fumega.” Também nós, Senhor, não o faremos. Na nossa fraqueza, estamos Contigo. No nosso nada, somos Teus. O Evangelho é nossa lei. Tua Palavra nos orienta e revela Teu amor — incontestável, irrevogável. Amor pelos caniços rachados, pelos pavios que já nem fumegam. E, movido por uma inexplicável compaixão, o Senhor acredita em nós.
Maria Amélia é a representação desse caniço, desse pavio. Para o mundo, descartável. Para nós, milagre. Não, jamais! Com São Bento, repetimos:
A Cruz Sagrada seja minha luz,
Não seja o dragão meu guia.
Retira-te, Satanás!
Nunca me aconselhes coisas vãs.
É mau o que me ofereces,
Bebe tu mesmo o teu veneno. Amém!
Nossa missão hoje é amar. Só temos hoje para isso. Vivemos com os pés na realidade, mas com os olhos na esperança. Não tememos a morte, porque vivemos para encontrar-nos com Deus. E, como diz São Paulo, somos entregues à morte todos os dias. A vida está nas mãos de Deus.
Senhor, Maria Amélia é Tua. Foste Tu quem lhe deu a vida, e és Tu quem a tomará, no dia e hora em que quiseres. Clamamos por Sua intervenção, suplicamos por cura e sobrevivência, mas sabemos: ela nunca foi nossa. Pelo Batismo, é ainda mais Tua.
Faça-se a Tua Vontade.
Que nossa esperança jamais desfaleça.
Que o louvor nunca se afaste dos nossos lábios.
Louvado sejas, Jesus! O Pai nos vê e sabe o que precisamos. E sabíamos: precisávamos de Amélia. Ela é o presente que o Senhor nos deu hoje. Louvado sejas também pela nossa comunidade, que sofre e se alegra conosco. O que seríamos sem ela? Sem a oração dos irmãos, os sacrifícios escondidos? A você que lê: muito obrigado. É por meio de vocês que conseguimos seguir. Isso é ser Comunidade. Isso é ser Igreja.
Tudo é graça!
Por Joaz Júnior